Uma gota de suor caiu na ponta do meu nariz. A minha franja estava
ensopada. Meus cabelos, minha pele e minhas roupas encharcadas de suor. Aquela
era uma das piores tocaias que eu já tinha feito. Vigilância cerrada, 24 horas
por dia, até ter a chance de eliminar o alvo. Isso não era o problema. Quando
se escolhe essa profissão, não se tem muita chance. Ou você se acostuma, ou não
dura muito tempo. O problema era aquele maldito verão sem fim. Os termometros
da cidade nunca tinham registrado temperaturas tão altas, e o sol fazia questão
de aparecer sempre que possível, escaldando o infeliz que não conseguisse
encontrar uma sombra ou um ar condicionado.
Isso, e a demora. Já faziam dois dias que eu vigiava aquele homem,
um empresário do ramo de metalúrgica, que andava incomodando as companhias mais
tradicionais do ramo. Não que eu me importasse. Ele podia ser um empresário, um
ladrão, um artista, um mendigo. Desde que o pagamento – metade antes e metade
depois do serviço - fosse devidamente
realizado, o serviço era garantido. Sem perguntas. Sem detalhes. Um nome, um
lugar. E um resultado, garantido. Não há descanso enquanto o contrato não foi
cumprido. O que uns chamam de teimosia, tinha se tornado minha melhor
qualidade. Antigamente, eu era procurado para os serviços mais diífceis, alvos
bem guardados, diplomatas, indivíduos que não andavam sozinhos em nenhum
momento do seu dia.
Hoje era diferente. Os tempos mudaram, e as pessoas também. Talvez
eu estivesse ficando velho demais pra esse tipo de profissão. Quem sabe eu
devesse me aposentar, arranjar uma casa em algum lugar agradável e frio, com um
terreno não muito grande ao redor. Eu conseguia imaginar o lugar. Teto alto,
paredes de pedra, uma lareira para apreciar no inverno. É, aquela era uma boa
idéia. E os cabelos brancos que começavam a se espalhar pelos meus cabelos e na
minha barba concordavam, também. Aposentadoria, pensei. Não é de todo uma má
idéia.
Acendi um cigarro. A fumaça espiralou em direção ao forro do teto
baixo. As paredes de carpete estavam amareladas pelo tempo, e o tapete que
cobria quase todo o chão era pontilhado aqui e ali por marcas de bebidas
derramas. E a cada vez que eu me levantava, batia a cabeça naquele maldito
teto. Nem sinal do alvo nas últimas três horas. O apartamento do outro lado da
rua era mais quieto do que uma igreja fechada. Aquele trabalho todo parecia uma
furada.
Pelo visto, nada ia acontecer por algum tempo. Dei uma longa
tragada no cigarro, me recostei na cadeira e comecei a analisar a torrente de
memórias que me levaram até ali.