Nas 7 horas da manhã eu descobri o fogo

Sustos, sustos, palavras soltas como "força" e "tragédia" permeavam uma lista de pensamentos de outras pessoas na tela do meu computador. Digo, no Twitter. Costumo dar uma checada na internet quando chego em casa do trabalho, até o sono chegar, quando ele chega.
Sábado [ou chame de domingo, seu herege que troca datas à meia-noite] não foi diferente. Cheguei em casa meio exausto, às sete da manhã, trezentas fotos a tiracolo e um arrependimento por não ter feito algumas coisas que perdi a oportunidade. Me sentei na cadeira, velhíssima, do tempo da minha vó, mas com um estofado razoável, mas que me dá uma dor nas costas do diabo. Desce a página, desce a página, links de notícias em jornais, alguma coisa de alguma tragédia. Vejamos, deve ser algo pequeno, local.

Às 7 da manhã, eu descobri o fogo.

Tragédia em Santa Maria. Naquela hora, ainda se estimava em cinquenta mortos no total. Claro, meu primeiro pensamento foi pra Bona, minha amiga, fotógrafa do Facool em SM. Ela sempre ia na Kiss. Busca desenfreada, mal digitada, por redes sociais pouco úteis em momento de pressa. Achei ela, tava bem. Mas a coisa tinha sido feia. Demorei pra dormir pensando nisso.

Ao meio-dia, eu descobri a tristeza.

Atualização após atualização, de todas as fontes diferentes. Só algumas confiáveis, mas todas terríveis. Consegui montar um quadro razoável da situação. Duzentos e poucos mortos, outro tanto de feridos. Todos recém aprovados no vestibular. Lembrei de quando EU tinha passado no vestibular. Não tinha dado muita bola. Se passei, que bom, se não passei, tentaria de novo. Mas eu sou a exceção. Apostei comigo mesmo que eram um monte de jovens cheios de sonho. Talvez alguns fossem maiores que os outros, mas não me cabe medir sonhos. Mal sei medir distâncias.

Que domingo horrível. Fatos se empilhavam, era só nisso que se falava. Não lembro o que eu almocei. Estava de ressaca. Acho que não comi. E aí, começaram a aparecer os paladinos do humor negro e da liberdade de expressão. Dos quais sou adepto. Quando apropriado. Saí da internet, e fui dormir.

Às seis da tarde, dizia um poeta, soprava um vento forte no pampa.

Carregava as almas e os sonhos de todos aqueles jovens. Tanto potencial. Tanta oportunidade. Não quero culpar ninguém. Não faço isso, nunca. Não por falta de culpa pra distribuir, mas eu não ganho nada com isso. Provavelmente, há mais culpados do que se pensa. Agora, há manifestações de todos os jeitos e tipos, clamando proibições e abstenções e sanções. Acho que só querem atenção. Mantenho minha neutralidade quanto a isso também. Desgaste mental.

Reconstruiremos, claro. As famílias encontrarão alguma forma de lidar com a tristeza. Os revoltados encontrarão outro assunto pra reclamar. Os piadistas, até já pararam. Foi um domingo de bosta.

Mas foi nesse domingo que eu descobri o fogo.


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